Autor Convidado: André Coelho

Cripto moedas e blockchain: A inovação que desafia o status quo da sociedade

Vivemos um período em que todos nós em maior ou menor medida nos vimos obrigados a adaptar-nos à inevitável transformação digital exigida pela situação pandémica. Aprendemos a trabalhar remotamente com resultados surpreendentemente positivos; pusemos os nossos pais e avós dependentes de um telemóvel para substituir os abraços que a pandemia deixou suspensos; fomos ao ginásio “online”; deixámos de ver o comércio online como uma alternativa, mas sim como uma inevitabilidade. No entanto continuamos dependentes das mesmas formas de pagamento, de celebração de acordos e contratos associados a uma compra ou cessão, e recorremos aos mesmos métodos rudimentares para exercer o direito de voto…

Parece-me obvio que temos um grande trabalho a desenvolver nestas e outras áreas, porque não é aceitável nem sustentável por exemplo continuar a utilizar como meio de pagamento “digital” cartões de crédito com um código de “segurança” CVV na maioria dos casos visível na traseira do cartão físico; não podemos estar limitados por tediosos processos burocráticos e inúmeros intermediários para celebrar um contrato de por exemplo compra e venda de uma casa; não podemos continuar a votar quase exclusivamente de forma presencial, com taxas de abstenção quase sempre superiores a 20%. Estes são apenas alguns exemplos de problemas da nossa sociedade aos quais temos o dever de dar resposta colectivamente apoiados pela tecnologia. A solução existe mas a sua adopção choca de frente com o sistema bancário tal e como o conhecemos, com o poder governamental centralizado que permite manipular a economia (Alguém sabe a quantidade de dinheiro fiduciário que se tem imprimido nos últimos anos? Não deveríamos ter o direito a aceder a esta informação?), e por último com uma parte da indústria a quem não interessa a adopção rápida de estas soluções porque compromete o seu modelo de negocio e permite a proliferação de mais concorrentes.

Photo by Nick Chong on Unsplash

Neste contexto, não surpreende que o Banco de Portugal tenha emitido um comunicado há apenas algumas semanas, precisamente quando a principal e mais conhecida cripto moeda do mundo (Bitcoin) atingia o seu máximo histórico (~47 mil euros) entretanto superado à data deste artigo, alertando para os riscos associados à utilização e comercialização de activos virtuais (ver comunicado aqui). Por outro lado, ironicamente a Autoridade Tributária reconhece que “a actual legislação fiscal portuguesa não contempla este tipo de actividade”, mas refere que os rendimentos auferidos e associados a operações com cripto moedas têm de ser tributados em sede de IRS. Parece-me legítimo alertar a sociedade para a volatilidade das cripto moedas e outros activos digitais, mas por outro lado parece que existe um complô formado para garantir a desinformação e gerar medo associado a este tipo de investimentos/soluções.

Não querendo abrir o debate da legitimidade do Bitcoin ou das cripto moedas, é importante reflectir sobre a bases tecnológicas em que se baseiam e que benefícios e soluções podem trazer para a sociedade. Provavelmente apenas uma pequena minoria da população ouviu falar da Blockchain (ou cadeia de blocos em bom Português), e menos são os que sabem o que é realmente e em que se baseia. Estamos a viver a era em que a Blockchain nos é tao familiar como era a Internet no ano da sua invenção (1990). Será que tem também o potencial de alterar definitivamente o curso da humanidade? A minha opinião é de que estamos perante a maior invenção do século. 

A tecnologia/protocolo blockchain nasceu em plena crise económica mundial no ano 2008 impulsionada como sabemos por uma bolha imobiliária, com o objetivo de evitar a duplicidade do gasto dos valores e aumentar a confiança e transparência das transacções financeiras. A blockchain foi utilizada a primeira vez como protocolo para permitir a circulação da primeira moeda digital (Bitcoin). Simplificando, a blockchain é uma rede que funciona a través de blocos encadeados y encriptados, cujo conteúdo está sempre associado a um código digital. No caso do Bitcoin por exemplo, esse conteúdo seria uma transacção financeira. A beleza do blockchainé que cada bloco posterior na sequência de blocos (ordenados de forma cronológica) vai conter o código digital do anterior mais o seu conteúdo próprio, o que permite gerar o seu próprio código digital, e assim sucessivamente, permitindo o controlo y visibilidade de toda e qualquer transação de forma completamente descentralizada. Infelizmente não é fácil explicar sem aprofundar e entrar em pormenores técnicos daí que recomendo o seguinte artigo para quem quiser aprender mais sobre Blockchain e suas aplicações: link.  

Porque é tão promissor blockchain? Nomeadamente no sector financeiro, o protocolo Blockchain vem resolver um problema de confiança entre as partes devido à sua natureza descentralizada proporcionando a imutabilidade e rastreabilidade de todos os processos sem que um individuo, grupo de pessoas ou instituição possam assumir o controlo do sistema individualmente. No caso do Bitcoin ou de qualquer outra representação de valor digital basada em blockchain, todos os utilizadores/membros da rede tem o controlo colectivamente de forma completamente descentralizada.

Ainda que actualmente o protocolo blockchain se utilize maioritariamente para o registo de transacções financeiras, este permite armazenar qualquer tipo de dados/informação, e começamos a observar diferentes aplicações em várias indústrias/sectores, como o Retalho, Aviação, Indústria Automóvel, Saúde, Telecomunicações, etc. 

Recentemente, a Forbes publicou o top 50 das empresas que lideram a implementação da tecnologia blockchain para acelerar, aumentar transparência e eficiência dos seus processos de negocio: link. É curioso observar que a maioria das empresas que constam desta lista não especulam com Bitcoin. O real valor é dado pela tecnologia subjacente ao Bitcoin que lhes permite acelerar o negócio e garantir a sustentabilidade do seu modelo.

Em particular, penso que a pandemia veio acelerar uma já importante preocupação da sociedade pela gestão e controlo dos nossos dados pessoais. A pandemia incrementou exponencialmente a importância dos dados pessoais para que qualquer empresa ou instituição possa chegar aos seus públicos alvo a través de diferentes canais. Será inevitável que empresas como Facebook, Google, WhatsApp, apostem na aplicação da metodologia blockchain para levar a cabo a gestão de dados pessoais ainda que esta seja claramente uma ameaça ao seu modelo de negócio.

Queria concluir este texto de opinião animando a todos os que o leiam a que se interessem e aprendam sobre este tipo de inovações tecnológicas para que colectivamente podamos lutar contra a desinformação através da difusão de factos. A tecnologia deve ser sempre vista e utilizada como um acelerador de inovação, e não como uma ameaça ao Status Quo em que se baseiam actualmente sistemas financeiros, governamentais e económicos.

André Coelho

https://www.linkedin.com/in/andr3coelho/

#SociedadePortugal; #AutoresConvidados; #BlockChain; #CriptoMoedas

Publicado por Hugo Barbosa

Empenhado em deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrei!

3 opiniões sobre “Autor Convidado: André Coelho

  1. Olá André,
    Muito bom artigo, e parabéns por conseguir explicar de forma simples algo que é muito complexo, como o caso desta tecnologia. Efectivamente é algo que pode (e creio que vai) mudar o mundo, e todos, tarde ou cedo, vamos sentir o impacto (como por exemplo aconteceu com a internet). Venho de um passado na banca de investimento, e trabalhando em mercados financeiros, e realmente mais de 50% das posições de back office com que trabalhava (e que numa distruibuição piramidal de um “banco tradicional” – com front/middle/back office representam a grande fatia de trabalhadores) são completamente redundantes face a nova realidade que o blockchain permite. É interessante ver que os bancos sabem isso, mas a balança de responsabilidade social e o poder político atrasam a implementação desta nova tecnologia, e a minha opinião é que se trata de um tema de difícil julgamento. Como em muitos outros momentos da história da humanidade, podemos estar perante uma nova revolução tecnológica, e só a nossa capacidade de nos adaptar limitará a velocidade de acesso a este novo mundo.
    Cumprimentos,
    Roberto

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    1. Olá Roberto. Muito obrigado pelo comentário e pelo interesse. Não podia estar mais de acordo contigo. Estamos perante a maior revolução tecnológica do século, e apenas no inicio da curva de adopção tecnológica. As barreiras, e restrições vão ser mais que muitas, mas estou confiante de que a aplicação da tecnologia em outras indústrias e sectores vai acabar por forçar o poder governamental e financeiro a ceder. Pelo caminho é óbvio que teremos paises a banir cripto moedas, ou regulamentação altamente restrictiva, mas esse é o preço a pagar quando a tecnologia desafia o status quo da sociedade. André

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