Acredito que para transformar o mundo… para o deixar “um pouco melhor do que o encontramos”… necessitamos de manter uma visão critica sobre o mesmo assim como de ter a coragem de intervir sobre o que pensamos ser os seus problemas e limitações!
No entanto, um dos vícios com que mais vezes me deparo, neste propósito de procurar actuar sobre os problemas da nossa sociedade, é o não reconhecimento do muito que já evoluímos… e do sentido globalmente positivo desta evolução observada nas últimas décadas.
Pelo contrário, encontro uma tendência para romantizar o passado, como se há cinquenta ou sessenta anos vivêssemos numa sociedade melhor e mais justa, entretanto corrompida pela globalização e pela ambição desmedida de um mundo que só encontra valor no dinheiro!
Ora esta mistificação do passado não só é irreal como nos impede de avançar já que se foca nos supostos méritos do passado em vez de se focar na construção do futuro.
Claro que todos temos memórias de um avô extraordinário que nos passou os valores fundadores das nossas convicções mais profundas, que nos fazem olhar para o passado como referência de futuro!… Claro que todos nos lembramos do profundo sentido de família que se vivia em casa dos nossos avós, naquelas saudosas festas com tios, primos e amigos… às quais, muitas vezes, gostaríamos de recuar para as voltar a viver!
Mas este não é o retrato da sociedade de então!… Estas são memórias de criança… importantíssimas para cada um de nós… mas vividas numa bolha de amor que nos protegia de um mundo exterior que em grande medida desconhecíamos.
E esse mundo era bem mais difícil do que o mundo de hoje… pelo menos para a grande maioria das pessoas que não nasciam em “berço de ouro”!…
Para melhor explicitar este meu pensamento convido-vos a pensar como seria viver, em Portugal, há cinquenta ou mais anos!…
E comecemos por pensar sobre o que significava “Nascer Pobre” nesse passado não tão longínquo?… Ora, a resposta a esta pergunta é bem simples… nascer pobre significava não ter qualquer salário nem garantia social… significava viver de caridade ou viver de trabalho esporádico, pago “ao jornal” para garantir parca comida na mesa!…
Escola? Isso era para os ricos!… os pobres faziam, quando muito, a quarta classe que os seus braços eram essenciais para reforçar o sustento para casa!…
O resultado disto era a perpetuação da pobreza… filho de pobre era, na esmagadora maioria dos casos, um adulto pobre… que criaria filhos pobres…
Não quero com isto sugerir que “ser pobre” seja, nos dias de hoje, tarefa fácil!… Mas as conquistas sociais relacionadas com o direito ao trabalho, o salário mínimo, as prestações sociais, a escola publica e o acesso à saúde… tudo isso produziu uma evolução extraordinária nas oportunidades de todos de subirem a escada social.
De tal maneira que ser filho de pobre já não é sentença de pobreza vitalícia!… Sim que continuam a ter um caminho mais longo… sim que os privilégios de nascença continuam a fazer com que nem todos tenham a mesma linha de partida… mas pelo menos, todos podem almejar ao mesmo horizonte!
A segunda dimensão sobre a qual gostaria de vos convidar a reflectir, é a diferença entre géneros. Ser Mulher em Portugal significava ser “propriedade de outro”… primeiro do pai… depois do marido!… Significava não poder viajar sem autorização… não poder trabalhar a menos que o marido estivesse de acordo!
Significava servir o marido e os filhos com subserviência, criando os filhos para serem “chefes de família” e as filhas para “servir”!…
Ser mulher significava estar sujeita a violência conjugal, sem qualquer protecção, já que era direito, e obrigação, do marido disciplinar a sua esposa!
Não significa isto que todas as mulheres fossem infelizes… nem que todos os homens fossem abusadores!… Mas, quando pensamos na sociedade actual, e na forma como as mulheres foram impedidas de realizar todo o seu potencial durante tantas décadas, não podemos deixar de reconhecer o longo caminho que efectuamos enquanto sociedade!…
Um caminho que não está acabado… ou não soubéssemos que estamos longe da paridade de género tanto no acesso às oportunidades, como nas diferenças remuneratórias entre homens e mulheres, como em outros aspectos da nossa vida social, política e empresarial!… Mas seria desonesto não reconhecer o muito que já evoluímos!

Por fim queria falar sobre inclusão… sobre a aceitação da diferença enquanto elemento positivo e enriquecedor do nosso tecido social!… E, sobre este aspecto, creio que o melhor exemplo é o da identidade de género!… Ora, não é preciso recuar muitos anos para que nos lembremos de como a sociedade marginalizava todos aqueles que não encaixavam nas suas próprias convenções!… Só eu, que cresci em meio pequeno, conheço quem tenha sido forçado a viver numa pele que não era a sua por toda a sua vida!… Assim como conheço quem se tenha recusado a fazê-lo, enfrentado a rejeição familiar, a recusa dos seus direitos de herança, o despedimento dos seus empregos… conheço quem tenha emigrado para poder “viver em paz”!… Enfim, conheço… como conhecemos todos… a forma ignóbil como se “criminalizava” a diferença por preconceito e ignorância!…
E, uma vez mais, é preciso reconhecer que não está tudo feito… longe disso!… “Ser diferente” continua a carregar um estigma que magoa e marginaliza de forma absolutamente inaceitável… mas não reconhecer o tanto que se avançou é não contribuir para que, em cima das conquistas já atingidas, continuemos a caminhar, na direcção correcta, rumo a uma sociedade que não apenas “aceite a diferença” mas que seja capaz de a “abraçar” e acolher como verdadeira fonte de riqueza social que, efectivamente, é!
Reconheçamos, assim, que vivemos, hoje, numa sociedade melhor do que a de ontem… e estaremos mais próximos de continuar a contribuir para que esta evolução continue e os nossos filhos possam beneficiar de um mundo mais inclusivo e mais justo para todos!
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